SOBRE GARRAFAS DE GÊNIOS E TAPETES VOADORES
Olá a todos! Nesse post vou falar um pouco sobre dois elementos que fazem parte da história do Aladdin tão conhecida do grande público: a lâmpada com gênio e o tapete mágico voador.
A maioria do público conhece a história Aladdin por causa do longa de animação da Disney, entretanto, existem diferenças consideráveis entre esse do desenho da Disney e o das histórias originais em árabe. Cabe dizer que a história do Aladdin faz parte da grande coletânea das "Mil e Uma Noites" que apareceu em manuscritos em meados do séc. IX o fio condutor é a história do rei Shariar que descobriu que sua esposa o traía e passou a dormir com moças e matá-las. Sherazade se ofereceu para parar isso contando histórias que entretinham o rei, muitas histórias são narradas por ela a do Aladdin é uma delas. Os manuscritos das Mil e Uma Noites circularam nas mãos de escribas anônimos que foram acrescentando mais histórias até um escriba anônimo do final do séc. XVIII do Egito reunir em uma forma "definitiva" esse é que serviu de base para a maioria das traduções atuais das Mil e Uma Noites. O primeiro ocidental a traduzir narrativas das Mil e Uma Noites foi o francês Antoine Galland em meados de 1700.
Em relação a garrafas com gênios presos, técnicas do tipo não são exclusividade dos árabes, nem dos judeus, é coisa muito antiga existem fórmulas conjuratórias em escrita cuneiforme da Assíria de milhares de anos atrás. Falando especificamente sobre a relação do rei Salomão com tais técnicas os adeptos da magia cerimonial ocidentais estão bem cientes, há manuais, grimórios e boa literatura de base, daria um trabalho de pesquisa considerável reunir tudo (até fiz um livro mas nunca se pode considerá-lo completo pois sempre surgem novas referências) mas, faço citações esporádicas em vários lugares por aí onde escrevo na net. Vou trazer uma citação de "Magia Oriental" do Idries Shah onde ele diz que teve acesso a um manuscrito árabe de um adepto autodidata, que, a julgar pela escrita seria de meados do séc. XVIII onde é descrito um sistema típico de evocação onde o adepto deve fazer um preparo, purificação, e etc. Em certo ponto se menciona uma garrafa para prender o "espírito" veja:
"Tome a cauda de um gato e coloque-a junto com várias gotas de índigo numa pequena garrafa de metal que só pode ser feita de bronze. Se for feita de bronze, serão evitados perigos(...).
Certifique-se que você tem uma tampa para a garrafa. Esta deve ser apertada e feita de chumbo e de nenhum outro material. Essa tampa é então colocada na garrafa, de forma que sobre um espaço. Nesse espaço verte-se breu derretido misturado com a seiva de um cedro."
O detalhe do material da garrafa adequada ser de bronze é reafirmado no livro "Os Vingativos Djinn" de Rosemary Ellen Guilley mas ela acrescenta a cobertura de ferro vale ressaltar. Na história narrada na "Goetia" é dito que Salomão prendeu aqueles 72 espíritos em um vaso de cobre, pode ser que seja um erro de tradução pois a maioria das fontes confiáveis dá preferência ao bronze para essa operação (embora eu já tenha visto relatos sobre vários outros materiais e objetos). Um arame de ferro nesse sistema é usado para impor sua vontade a espíritos rebeldes e torturá-los. Mas, a tampa de chumbo citada na obra de Idries Shah remete a outra narrativa onde o chumbo é usado com o propósito de "conter" entidades não muito bem compreendidas: a narrativa relativa Alexandre no Alcorão. Nessa narrativa os materiais que compõe a barreira de Alexandre que restringe o povo de Yajuj e Majuj (Gog e Magog) é feita primeiro se colocando blocos de ferro e depois despejando chumbo derretido veja no trecho do Alcorão cap. 18 versículos 96 a 97:
"Trazei-me blocos de ferro'. Depois quando tinha enchido o espaço entre as duas montanhas, disse: 'Trazei-me chumbo derretido para que derrame em cima deste ferro'. E Yajuj e Majuj não puderam nem escalar nem perfurar a barreira."
Também aqui existem variações nas versões onde no lugar do chumbo é dito cobre, embora o chumbo faça mais sentido sobretudo do ponto de visto simbólico já que os atributos do metal chumbo são relacionados a saturno, a saber: morte, ruptura drástica, recomeço, tristeza ou melancolia (Saturno é o nome romano de Cronos, deus grego do tempo que castrou seu pai Urano com uma foice, sendo retratado como um velho segurando uma foice, deve ser daí que evoluiu a imagem arquétipa do "ceifeiro" a "dona morte"). Passamos então ás referências ao "tapete mágico voador".
No desenho da Disney o tapete voador tem vida própria, é uma criatura viva que voa pelos ares carregando o herói por cima. Mas, nas narrativas relacionadas a Salomão o tapete não tem vida própria nem capacidade de voar por si mesmo, o que permite a ele voar são os djinns específicos do vento que o carregam. O tapete mágico do Aladdin da Disney;
Veja o que Idries Shah diz sobre isso no capítulo de "Magia Oriental" dedicado as façanhas mágicas de Salomão:
"Os cronistas árabes, acima de quaisquer outros, destacam-se na minuciosa atenção prestada ao lado oculto desse homem extraordinário.
Segundo a maioria deles, ele não só viajava pelo ar, como o fazia com toda a sua corte no tapete mágico original. Feito de uma espécie de seda verde, esse tapete era capaz de carregar centenas de pessoas de uma vez e estava sempre escoltado por revoadas de pássaros. Na tradição judaica diz-se que o tapete tinha 60 milhas quadradas e sua seda verde era entretecida de ouro."
É importante destacar que o poder de Salomão sobre os espíritos não era fruto de sua própria prática do oculto ou conhecimento recebido dos rabinos, era uma concessão especial divina que lhe fora dada. Veja o que diz o Alcorão no cap. 34 versículo 12:
"E demos a Salomão poderes sobre o vento cujo percurso matinal é de um mês e cujo percurso vesperal é de um mês. E, para ele, fizemos brotar a fonte de cobre fundido. E djinns trabalhavam para ele com a permissão de seu Senhor. E àqueles que desacataram Nossas ordens, infligimos o castigo das chamas."
Mais uma citação do Alcorão relativa a isso no cap. 38 versículos 36 a 37:
"Sujeitamos-lhe o vento que soprava na direção que ele indicasse, e os pássaros. E sujeitamos-lhe os demônios, construtores e mergulhadores de toda espécie,"
Existe um grimório chamado "Red Magick" atribuído a um tal feiticeiro egípcio chamado al-Toukhi que teria feito mais de 30 livros de mágica, astrologia, geomancia e evocação de espíritos. Teria sido feito em meados da Idade Média. Em um trecho dele se menciona o tapete mágico voador e diz que ele voava pelos ares graças a quatro djinns que eram considerados vizires de Salomão veja o trecho:
"Isso foi relatado por Ka'b al-Ahbar (Deus esteja satisfeito com ele!) ele disse: No tapete de nosso mestre Salomão, filho de Davi (sobre ele esteja a paz!) esse tinha quatro nomes hebreus pelos quais os djinns e demônios eram obrigados a obedecer. Eles subiam sobre o tapete e colocavam cargas sobre ele que suspendia pelo poder dos ifriits que eram vizires de Salomão entre os djinns. É relatado que era capaz de suspender trezentos homens e trezentos djinns. O grande vizir entre os homens era Asaph, o filho de Berachiah. E os grandes vizires entre os djinns eram quatro: Damryat, Sana'iq, Hadliyakh e Shooghal, eles estavam no comando da direção onde o tapete voava."
O texto relata a invocação, os atos e símbolos que devem ser feitos para chamar esses djinns. "Red Magick" é um grimório tipicamente árabe, embora contenha nomes hebraicos em várias partes. Foi publicado pela Ishtar Publishing e não é nenhum grande segredo ou raridade, qualquer um pode comprar no site da Amazon. Eu já havia expressado minha opinião sobre grimórios aqui nesse blog na postagem de título "OS GRIMÓRIOS" e reafirmo que não os considero como raridades ou obras indispensáveis para a prática do oculto, embora hajam adeptos que consigam fazer grande proveito deles, eu os considero mais como obras culturais que representam o estilo e a época do povo quem os produziu. Sobre as viagens de Salomão pelos ares, uma versão do "Kebra Nagast" menciona não o "tapete mágico" mas um outro tipo de veículo usado para esse propósito o que leva certos autores a postular a teoria que Salomão tinha um tipo de "Vimana" veículo aéreo típico da Índia antiga. Várias montanhas da Ásia Central tem o nome sugestivo de "Montanha de Salomão" ou "Trono de Salomão" e lendas de que Salomão e sua corte teriam viajado até ali pelos ares. Mesmo as Ilhas Salomão na Oceania tem histórias parecidas relacionadas ao rei de onde veio o nome, mas, cada um interpreta como quiser não afirmo esses detalhes como evidências históricas. Sendo assim, espero ter elucidado algumas referências de onde vieram os conceitos de garrafas de djinn e tapetes mágicos, ambos os elementos ligados diretamente aos relatos sobre o rei Salomão.